Ao final da unidade VI, esperamos que você seja capaz de:

O Processo de Socialização

INTRODUÇÃO

No fim do século XIX, caçadores encontraram uma estranha criatura vagando num bosque de Aveyron, no sul da França. Tratava-se de um menino, com aproximadamente12 anos, que mais se parecia com um animal do que com um ser humano. Estava nu, sujo, mordido e arranhado. Foi submetido a diversos exames e não apresentava nenhuma anomalia grave. Andava trotando, farejava o que lhe davam, roía os alimentos, negava-se a vestir roupas e de sua boca saíam sons como grunhidos.

Nunca se soube a sua verdadeira história; se o menino foi abandonado por sua família ou se perdeu. Sabe-se apenas que viveu em completo isolamento. Primeiramente fiou conhecido como Selvagem de Aveyron. Mais tarde, o médico e educador que se encarregou de sua criação o chamou de Victor.

Os esforços de socialização dedicados ao menino foram parcialmente satisfatórios, pois, ao morrer com cerca de 40 anos de idade, tinha uma aparência normal, sabia mostrar as coisas de que gostava, sorria; porém, jamais aprendeu a falar articuladamente.

A história acima contada retrata a importância da socialização na vida de um indivíduo. É uma introdução ao tema desta unidade, que o convida a conhecer como as pessoas aprendem os significados das coisas na sociedade da qual fazem parte; como compreendem o certo ou errado, bom ou mau, feio ou bonito etc. Além disso, será abordada a forma como se dão os diferentes papéis sociais na trajetória de um indivíduo, aprendendo sobre os principais agentes de socialização e o papel deles na construção da identidade do sujeito no mundo contemporâneo.

Vamos lá!

Mas antes, para ilustrar, gostaria que você assistisse o documentário anexo, ele trará grandes reflexões sobre o tema dessa unidade.

O SER HUMANO COMO SER SOCIAL

Os homens sempre viveram em grupos. Ao nascer, o homem já encontra um grupo estruturado, com valores, normas e costumes que lhe são transmitidos pelo processo de socialização. Assim, o homem aprende a viver naquela sociedade e é aceito pelo grupo, pois ele agrega à sua personalidade individual os traços da personalidade social que são difusos. O ser social que surge é então produto deste complexo sistema de interações.

O homem é um animal que depende de interação para receber afeto, cuidados e até mesmo para se manter vivo. Somos animais sociais, pois o fato de ouvir, tocar, sentir, ver o outro fazem parte da nossa natureza social. O ser humano precisa se relacionar com os outros por diversos motivos: por necessidade de se comunicar, de aprender, de ensinar, de dizer que ama o seu próximo, de exigir melhores condições de vida, bem como de melhorar o seu ambiente externo, de expressar seus desejos e vontades.

Essas relações que vão se efetivando entre indivíduos e indivíduos, indivíduos e grupos, grupos e grupos, indivíduo e organização, organização-organização, surgem por meio de necessidades específicas, identificadas por cada um, de acordo com seu interesse.

Vivemos em diversos grupos (familiares, de vizinho, de amigos, de trabalho) nos quais interagimos e crescemos. Os mais diversos grupos sociais influenciam na vida do indivíduo. O indivíduo tem, para si, claras as características que o diferencia dos demais, como seus fatores biológicos, seu corpo físico, seus traços, sua psiquê que envolve emoções, sentimentos, volições, temperamento.

Então, quando estudamos sobre o indivíduo, percebemos a forma como ele organiza o seu pensamento, seu comportamento. Assim, iremos concluir que essa construção e organização ocorrem, a partir do contato que tem com o outro. Por isso, temos a necessidade de estudar não só o indivíduo enquanto ser social, mas este influenciado por padrões culturais diante da sociedade em que vive, pois a cultura fornece regras específicas. Assim, para compreendermos o indivíduo e a sociedade, precisamos entender a cultura à qual pertencemos.

MAS O QUE É SOCIALIZAÇÃO?

Para o sociólogo brasileiro Gilberto Freire, a socialização pode ser definida da seguinte maneira:

“É a condição do indivíduo (biológico) desenvolvido, dentro da organização social e da cultura, em pessoa ou homem social, pela aquisição de status ou situação, desenvolvidos como membro de um grupo ou de vários grupos.”

A socialização (efeito de ser tornar social) está relacionada à assimilação de hábitos culturais, bem como ao aprendizado social dos sujeitos. Isso porque é por meio dela que os indivíduos aprendem e interiorizam as regras e valores de determinada sociedade.

Quanto a isso, vale lembrar as palavras do sociólogo francês Durkheim, quando afirma que:

“A educação é uma socialização da jovem geração pela geração adulta”.

De tal modo, o processo de socialização é desencadeado por meio da complexa rede de relações sociais estabelecidas entre os indivíduos durante a vida.

Assim, desde criança os seres humanos vão se socializando mediante as normas, valores e hábitos dos grupos sociais que o envolvem. Observe que nesse processo, todos os sujeitos sociais sofrem influência comportamentais.

Importante notar que existem diferentes processos de socialização de acordo com a sociedade em que estamos inseridos.

Qualquer que seja a classe social e a realidade, os processos de socialização são muito diversos. Tanto podem ocorrer entre pessoas que vivem numa comunidade como entre os burgueses que habitam a zona sul dos grandes centros.

Seja qual for a cor, a etnia, a classe social, todos os seres humanos desde cedo estão em constante processo de socialização, seja na escola, na igreja, na faculdade ou no trabalho.

As consequências dos processos de socialização geralmente são positivas e resultam na evolução da sociedade e dos indivíduos. Por outro lado, as pessoas que não se socializam podem apresentar muitos problemas psicológicos, determinados, por exemplo, pelo isolamento social.

O processo de socialização vem se alterando ao longo do tempo, através das mudanças da sociedade. Note que, os processos de socialização da antiguidade e da atualidade são bem distintos, o que decorre da evolução dos meios de comunicação e do avanço tecnológico.

AGENTES DO PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO

Vimos que nós fazemos parte de diversos grupos sociais e que é por meio desses grupos que o nosso processo de socialização ocorre. Temos, então, como agentes socializadores, de acordo com Savoia (1989), três grupos: a família, a escola (agentes básicos) e os meios de comunicação em massa.

O primeiro contato que o ser humano tem, ao nascer, é a família: primeiramente, com a mãe, por meio dos cuidados físicos e afetivos, e, paralelamente, com o pai e os irmãos, que transmitem atitudes, crenças e valores que influenciarão no seu desenvolvimento psicossocial.

Num segundo momento, tem a interferência da escola. Geralmente, nessa fase, o indivíduo já traz consigo referências de comportamentos, de orientação pessoal básica, devido ao contato inicial com a família. Já os meios de comunicação em massa são considerados como agente socializador, diante das inovações tecnológicas na atualidade histórica, porém nem sempre eles têm consciência do seu papel no processo de socialização e na formação da personalidade do indivíduo. Na família e na escola, existe uma relação didática e, com a TV, a relação é diferente, visto que a comunicação é direta e impessoal (SAVOIA, 1989).

Os processos de socialização estão classificados em dois tipos:

  • Socialização Primária: como o próprio nome já indica, esse tipo de socialização ocorre na infância e se desenvolve no meio familiar. Aqui, a criança tem contato com a linguagem e vai compreendendo as relações sociais primárias e os seres sociais que a compõem. Além disso, é nesse estágio em que são interiorizados normas e valores. A família torna-se a instituição social mais fundamental desse momento.
  • Socialização Secundária: nesse caso, o indivíduo já socializado primariamente vai interagindo e adquirindo papéis sociais determinados pelas relações sociais desenvolvidas, bem como a sociedade que está inserido. Se por acaso o sujeito social teve uma socialização primária afetada, isso poderá gerar diversos problemas na sua vida social, uma vez que o primeiro momento de socialização é essencial na construção do caráter do indivíduo.

Todo esse processo de socialização que os seres humanos vivenciam está ligado à cultura do indivíduo, como também a uma estruturação de comportamentos, à
medida que aprendemos e os internalizamos. Essa estruturação e atribuição de
significados ocorrem por meio da interação com os outros. Isso faz com que criamos expectativas sobre esses comportamentos diante do grupo social, desenvolvendo papéis sociais, pois o processo de socialização pode ser visto também como um processo pelo qual cada indivíduo configura seu conjunto de papéis.

OS PAPÉIS SOCIAIS

Os papéis sociais são formas de comportamento previamente estipuladas para os indivíduos de uma posição social específica.

Você provavelmente já se deparou com uma situação em que as pessoas envolvidas esperavam um tipo de comportamento de sua parte tendo como base uma característica sua. De uma mulher, por exemplo, é geralmente esperado que se tenha o que chamamos de “sentimento maternal”, uma afinidade ou desejo natural em desempenhar o papel de mãe. De um homem, espera-se o papel do sujeito corajoso e destemido, de forma que a covardia e o medo são vistos como características impróprias e dignas de zombaria. Já de um policial, por sua vez, o papel de justo e combatente do crime é atribuído a ele naturalmente. Essas características associadas a uma posição social são o que chamamos de papéis sociais.

Os conceitos preconcebidos que utilizamos para nos posicionar no meio social geralmente são equivalentes ao papel social que supomos ter. Para entendermos melhor, voltemos ao exemplo do policial. Comumente, considera-se que um policial possui um conjunto de comportamentos comum a todos os policiais, sem se levar em consideração as perspectivas pessoais daquele sujeito específico. As responsabilidades atribuídas a esse grupo de profissionais e que, naturalmente, espera-se que sejam cumpridas, estão ligadas a certos valores, como a ideia de justiça e honra, que são automaticamente atribuídas aos indivíduos que assumem essa profissão.

Os papéis sociais estão associados a várias outras características específicas de um sujeito. Os teóricos da Sociologia funcionalista, a escola de pensamento sociológico que entende que as sociedades são “sistemas orgânicos” em que as estruturas sociais trabalham em conjunto de forma a gerar estabilidade, entendem que os papéis sociais são fatos sociais.

Todavia, como já salientamos, os papéis sociais também estão ligados a pontos mais pessoais do indivíduo. Da mesma forma que esperamos um tipo de comportamento de um professor, também existem expectativas de comportamento baseadas em outros atributos do sujeito. Nessa visão, o indivíduo aprende quais são as expectativas que determinadas posições sociais possuem dentro de seu contexto cultural e passa a agir de acordo, cumprindo o papel que lhe foi designado.

O exemplo do sentimento maternal que toda mulher aparentemente deveria ter demonstra que certas atribuições de papéis moldam o comportamento dos indivíduos em sociedade. O sentimento maternal não é algo natural, isto é, nem todas as mulheres nascem com ele, pois existem mulheres que não se identificam com a imagem de mãe ou não possuem desejo algum em se tornarem mães. Dessa forma, podemos perceber que essa concepção de papeis fixos está errada. Os indivíduos não apenas assumem papéis sociais previamente concebidos e designados de acordo com posições sociais; ao contrário, os sujeitos são agentes que possuem liberdades individuais e são capazes de modificar, criar e negociar as funções que desempenham de acordo com suas particularidades.

O SENTIDO DO STATUS SOCIAL

Apesar de semelhantes, os conceitos de status papel social definem duas coisas distintas no campo de estudos da Sociologia. Por isso, precisamos saber qual a utilidade de cada um desses conceitos e que tipo de informação eles nos repassam. Em primeiro lugar, é de suma importância apontar que tais conceitos são necessários para uma análise um tanto mais profundo da pirâmide social que organiza algumas coletividades.

A ideia de status social está ligada às diferentes funções que um sujeito pode ocupar no interior da sociedade em que vive. Se o compreendermos como um sujeito oriundo das classes médias, por exemplo, podemos enxergar quais hábitos, vínculos e funções que podem definir seu status no meio em que vive. Para tanto, avaliamos qual tipo de posto de trabalho ocupado, os locais de lazer frequentados, o partido político ao qual está filiado e sua posição no núcleo familiar. Para se estabelecer uma definição mais bem acabada sobre os diferentes tipos de status que uma pessoa pode ter, os estudos sociológicos costumam grifar a existência de dois tipos de status: o status atribuído, em que alguém ocupa determinada posição independente de suas próprias ações(como: idade, filho, irmão, etnia, raça, sexo, nacionalidade, parentesco, rei, classe social, religião, etc.”); e o status adquirido, situação em que a pessoa age em favor de certa condição  (pai, mãe, delegado, professor, médico, goleiro, juiz, advogado, cantor, escritor, etc).

Na compreensão de algumas culturas, a relação entre o status e o papel social pode nos mostrar algumas diferenças bastante interessantes. Realizando um contraponto entre duas sociedades, é possível analisar que indivíduos com status sociais semelhantes são levados a desempenhar diferentes funções. Um exemplo disso pode ser notado quando pensamos em um curandeiro de uma tribo indígena e o médico de alguma sociedade capitalista.

Enquanto o primeiro vive em contato com a comunidade e se utiliza de rituais religiosos para cumprir a função de curar pessoas, esperamos que um médico esteja em um consultório e que domine o uso de uma série de procedimentos científicos para realizar essa mesma tarefa. Assim, vemos que status e papel social são ferramentas teóricas de suma importância para o desenvolvimento de vasto leque de temas e objetos da Sociologia.

Concluindo, os status indicam às pessoas que o possuem quais são os papéis sociais que devem desempenhar. O comportamento esperado de um diretor de empresa, de um professor, de um pai, de uma mãe ou de um militar é individualmente diferente e determinado pelo status social.

Assim como num palco, cada indivíduo exerce um papel social seguindo um script de natureza social, que orienta o seu comportamento.

OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA NO PROCESSO

A “nova era social é regulada por um universo cultural amplo e diversificado, embora fragmentado” (SETTON, 2002, p.3). Os meios de comunicação de massa, particularmente a televisão, se tornaram importantes agentes de socialização, não só de crianças e jovens, mas também de adultos. Por meio dos noticiários, novelas, filmes, seriados e programas em geral, são incentivados comportamentos positivos e negativos.

Os jovens, em especial, tendem a ser muito influenciáveis em seu comportamento, sendo incentivados pelos meios de comunicação à prática de novos hábitos e atitudes. Alguns programas, especificamente as telenovelas e minisséries, fazem parte do dia a dia dos telespectadores no Brasil. Neles normalmente os atores baseiam se em estereótipos de grupos sociais e tendem a reforçar suas características.

Para entendermos melhor essa questão, utilizaremos o exemplo do estereótipo da mulher loira, bastante explorado como personagem ignorante, que dedica grande parte do seu tempo a atividades fúteis. 

Ao longo dos tempos, nas telenovelas, minisséries e filmes da TV, os atores negros ocuparam, e ainda ocupam, posições secundárias, de menor status na sociedade brasileira.

Assim como a televisão, a internet, no papel de veículo de comunicação de massa, vem assumindo importante função socializadora. Ela permite, por exemplo, que seus usuários acessem informações do mundo todo e em tempo real, estabeleçam relacionamentos online e pratiquem jogos virtuais. Mas o seu uso tem se tornado fonte de grande preocupação para pais, educadores e, inclusive, autoridades policiais. O motivo é a veiculação, por exemplo, de imagens e filmes pornográficos, práticas terroristas, jogos violentos, incentivo a anorexia e ao suicídio; além da rede virtual de pedofilia que se formou e se expande com o passar do tempo.

Assista aos vídeos desta Unidade e aprofunde mais sobre o assunto:

REFERÊNCIAS

  • RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito Empresarial. 12ª Ed. São Paulo: Método, 2022.
  • NETO, Alfredo de Assis Gonçalves. Direito de Empresa. – 10. Ed. – São Paulo: Revista os Tribunais, 2021.
  • COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial – 24. Ed. – São Paulo: Revista os Tribunais, 2021.
  • FAZZIO JR. WALDO. Manual de Direito Comercial – 21. Ed. São Paulo: Atlas, 2020.
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